Chamo-me Francisco Catarino, tenho 45 anos e sofro de epidermólise bolhosa simples, a forma menos grave desta terrível doença rara. O aparecimento das bolhas teve início pouco tempo depois do nascimento. A minha mãe conta que andava a fazer uma seara e que me deixou a dormir a sesta a uma sombra. Quando acordei ela notou que eu tinha uma bolha numa perna. Depois dessa bolha, muitas outras vieram a nascer sobretudo no Verão e com maior incidência nos pés e mãos. Desde tenra idade que a minha vida foi passada dentro de consultórios médicos, desde o médico de família passando pelos médicos mais conceituados na zona até aos dermatologistas em Lisboa. A resposta era sempre a mesma: “a doença nasceu com ele e com ele há-de morrer”. Na altura percorri curandeiros e “bruxas”, procuramos a cura através da medicina alternativa mas nada deu resultado.
Quando completei 18 anos decidi procurar um dermatologista que me dissesse o nome da doença e se havia tratamento para ela. Ela fez-me uma biopsia a uma bolha que eu criei num braço e lá descobriu então que eu padecia de epidermólise bolhosa.
No meu caso concreto as bolhas formam-se sobretudo nos pés por causa da fricção do calçado e também nas mãos se precisar de fazer algum trabalho manual que exija mais esforço. E é com o calor que há maior probabilidade de formação de bolhas, seja o calor do sol, seja de um aquecedor ou outra fonte de calor. Para me sentir bem e não ter bolhas, tenho que ter os pés frios, de preferência muito frios.
Os meus pais deram-me a possibilidade de estudar até ao 12º Ano para que pudesse ter um futuro e um emprego que não passasse pela construção civil ou pela floresta, a saída profissional mais usual na altura. Quis o destino que aos 35 anos eu viesse a ser vigilante numa empresa de segurança privada. No início a actividade era desenvolvida na recepção de uma Câmara Municipal onde passava o dia sentado e só tinha que fazer uma ronda quando entrava e outra quando saía. Á medida que o tempo foi passando, fui sendo mudado para outros serviços até que chegou a altura de começara fazer rondas. Agora desenvolvo a actividade profissional numa estação de caminhos de ferro e penso muitas vezes que poderia ter sido maquinista dos comboios ou camionista porque passaria o tempo de trabalho sentado. Mas eu não tive hipótese de escolha na altura em que entrei para a segurança. Foi o que apareceu após um período de desemprego. No período do Verão as rondas são um autêntico suplício.
Mas há medida que os anos foram passando fui arranjando formas de minimizar o sofrimento, sobretudo com o calçado. Como nunca consegui encontrar calçado adequado para doentes com este tipo de doença optei por começar a usar sapatos só em couro, sem borracha. Qualquer tipo de calçado com sola de borracha provoca-me aquecimento nos pés. Não posso usar meias que não sejam 100% algodão. Nos calcanhares (para minimizar a fricção) coloco pedaços de umas palmilhas de esponja que adquiro nas lojas dos chineses e é também essas palmilhas que coloco nos sapatos para tornar o andar menos penoso. Depois são os cremes receitados pelo dermatologista quando tenho bolhas, mais alguns comprimidos para as dores e para as inflamações. Não cura mas minimiza o sofrimento diário.
Francisco Catarino
10 de Fevereiro de 2011